Após ter afirmado reiteradas vezes que não influenciaria de forma alguma a política de preços de combustíveis praticada pela Petrobras, no intuito de fornecer segurança ao mercado, o presidente Jair Bolsonaro abandonou a estratégia e anunciou na sexta-feira (19) que indicou como novo presidente da estatal o diretor da Itaipu Binacional, general Joaquim Silva e Luna. O atual presidente, Roberto Castello Branco, havia sido indicado pelo próprio Bolsonaro após a vitória nas eleições de 2018.

Para efetivação da substituição, é ainda necessário que o Conselho de Administração da Petrobras aprove a indicação, e uma reunião do conselho está agendada para esta terça-feira (23). Caso ela seja aprovada, Silva e Luna será o primeiro militar a chefiar a Petrobras em mais de 30 anos, desde que Orlando Galvão Filho, oficial da Marinha, deixou o cargo em 1989. Durante a maior parte da ditadura militar a empresa foi comandada por militares, chegando inclusive a ter na cadeira de presidente o general Ernesto Geisel, que viria a se tornar presidente da república em seguida.

A indicação sucede uma série de críticas de Bolsonaro à gestão da Petrobras, que responsabiliza pelas sucessivas altas registradas apenas esse ano nos preços dos combustíveis. No dia 20, sábado, o presidente classificou os aumentos como uma “covardia” e afirmou que seriam esforços para atacar seu governo. Avaliou também que estaria “fora da curva” o aumento mais recente, quarto do ano, de 10% na gasolina e 15% no diesel.

O Planalto e os preços

O acúmulo dos aumentos praticados nas refinarias este ano, até a última quinta-feira (18), compreendendo menos de 2 meses, é de 34,78% para o litro da gasolina e de 27,72% para o litro do diesel. Os postos ainda não estão repassando, na íntegra, esses aumentos ao consumidor, e a gasolina está cerca de 6% mais cara em comparação com a primeira semana do ano.

O encarecimento dos combustíveis é bastante danoso, tanto política quanto economicamente. Alterações dos custos do setor de transporte se difundem por todo o mercado e causam aumento generalizado de preços, o que prejudica a economia reduzindo a capacidade de consumo. Como consequência, a população, em dificuldade, fica mais insatisfeita com seus governantes e a popularidade do governo despenca. Daí a preocupação do Palácio do Planalto com uma alta tão severa.

Recepção

Analistas de mercado e antigos aliados de Bolsonaro não receberam bem a indicação, sustentando que Castello Branco vinha executando uma boa condução da empresa e que a substituição motivada por interesses eleitorais muito provavelmente trará prejuízos à estatal, uma vez que sua política atual de preços, baseada na paridade de importação, fortemente influenciada pelo preço do barril de petróleo no mercado internacional e pela cotação do dólar no Brasil, será provavelmente violada para evitar o repasse do aumento desses fatores à população.

Em 2018, Bolsonaro teria recebido a indicação de Castello Branco para a presidência da Petrobras de seu guru e ministro da economia, Paulo Guedes. Em face da substituição recente, entretanto, Guedes ainda não se manifestou.

Ex-integrantes do governo também se mostraram bastante insatisfeitos com a indicação. O ex-secretário de Desestatização do Ministério da economia, Salim Mattar, vê como “lastimável” a decisão e afirma que Castello Branco teria promovido grande recuperação da Petrobras após a empresa ter sido envolvido num dos maiores esquemas de corrupção da história.

Em coro, Paulo Uebel, ex-secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Luiz Octavio da Motta Veiga, ex-presidente da Petrobras e Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda, observam de forma receosa um forte paralelo entre a intervenção de Bolsonaro e práticas do governo Dilma.

Sombra projetada

A intervenção é mal vista porque levanta um receio justificado da falta de independência da empresa de coordenar suas próprias estratégias. O investidor perde confiança de que as mudanças previstas nos planos de gestão sejam de fato aplicadas, e de que sejam as únicas mudanças aplicadas. Além disso, ele perde a confiança de que será capaz de exercer a influência que deveria ser capaz de exercer como acionista.

Já em termos mais concretos, o investidor pode perder dinheiro com a desvalorização das ações da companhia e ainda pode perder dividendos caso haja redução dos lucros oriunda de uma absorção do aumento do custo de produção sem repasse ao consumidor.

Foi o que aconteceu nesta segunda-feira (22): como o mercado de ações é altamente especulativo e reativo, a mera substituição do presidente da Petrobras, sobretudo com o objetivo expresso de interferência na política de precificação, trouxe forte aversão às ações da empresa, cujo valor sofreu grande queda.

A queda nas ações da Petrobras também se estendeu, em menor escala, às ações de outras estatais. Isso porque os investidores passaram a temer que esse tipo de interferência possa também ser aplicado a empresas semelhantes quando for conveniente para o governo. Bolsonaro foi eleito defendendo uma agenda fortemente liberal, o que transmitiu tranquilidade aos investidores e confiança na capacidade dessas empresas de estabelecerem seus preços de modo competitivo. Eles, agora, temem o retorno de uma política intervencionista já observada no passado que poderia lhes causar prejuízos.