A desenvolvedora do popular jogo Fortnite, Epic Games, anunciou na quarta-feira (17) que protocolou uma reclamação formal antitruste contra a Apple na Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia responsável por propor legislação, implementar decisões e defender os tratados do bloco.

Este é apenas o movimento mais recente da Epic nessa batalha judicial que se iniciou em agosto de 2020, em que já abriu processos contra a Apple nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Austrália.

A Epic alega que, através de restrições anticompetitivas cuidadosamente projetadas, a Apple eliminou completamente a competição em distribuição de aplicativos e processos de pagamentos, e estaria usando seu controle do ecossistema iOS para se beneficiar, bloqueando a concorrência, conduta que constituiria abuso de posição dominante e violação das leis de concorrência europeias.

Tim Sweeney, fundador e CEO da Epic Games, afirma categoricamente que o que está em jogo nessa disputa é o próprio futuro das plataformas móveis. Para ele, os consumidores devem ter o direito de instalar aplicativos das fontes que escolherem, e os desenvolvedores têm o direito de competir num mercado justo. No estado atual do sistema operacional da Apple, os consumidores estão pagando preços inflados por falta de concorrência entre lojas e processadores de compras no aplicativo, além de haver controle excessivo sobre os desenvolvedores que criam para a plataforma.

O objetivo da Epic, com essa reclamação na União Europeia, diferentemente de suas outras iniciativas legais contra a Apple, não é de obter reparações por danos, mas sim a proibição das companhias das plataformas de usarem seu controle sobre o hardware para exercer controle sobre mercados secundários e forçá-las a competir em condições de igualdade.

Desavença antiga

Sweeney já questionava, desde 2017, a parcela de 30% do valor de venda de jogos e aplicativos cobrada pelas lojas digitais da Valve (Steam), da Apple (App Store) e da Google (Google Play). Até mesmo como forma de provar a abusividade desse valor, a Epic criou sua própria loja digital que opera de forma lucrativa retirando uma fatia de apenas 12%.

Quando o modo Battle Royale de Fortnite se tornou um sucesso em 2018, a Epic procurou disponibilizar o jogo nas plataformas móveis. A princípio, no sistema Android, conseguiu evitar a cobrança da taxa pela loja de apps da Google distribuindo-o por fora mas, por razões de segurança, eventualmente teve de publicar o jogo na Play Store, fazendo-o também na App Store da Apple.

Em 2020, Sweeney novamente manifestou-se contra a porcentagem cobrada pelas lojas e alegou que, caso outras empresas, incluindo a própria Epic, pudessem administrar suas próprias lojas no sistema iOS e pudessem processar os pagamentos de seus players, haveria competitividade e os itens vendidos nos aplicativos teriam preços muito melhores.

Eventos motivadores

Em 13 de agosto de 2020, a Epic lançou uma atualização de Fortnite contemplando todas as plataformas com um desconto no pacote da moeda virtual do jogo caso a compra fosse realizada diretamente com a empresa. Nas versões de iOS e Android, o jogo passou a oferecer dois métodos de compra, um através da respectiva loja digital oficial de cada sistema, com um preço mais alto devido aos 30%, e outro com o preço mais baixo, cujo pagamento seria processado diretamente pela Epic.

Como consequência do oferecimento de formas de compra em aplicativo processadas sem tráfego pelos servidores da Google e da Apple, dentro de poucas horas o jogo foi removido pelas responsáveis por ambas as lojas.

Esse foi um movimento intencional da Epic para forçar as responsáveis a revisarem suas políticas ou adotarem ações que prejudicassem a empresa, justificando a movimentação de ações judiciais contra ambas.

Desdobramentos

Além de remover Fortnite da App Store, a Apple também comunicou à Epic que, em 28 de agosto, bloquearia suas contas, ferramentas e licenças de desenvolvedor iOS. Isso seria prejudicial à própria indústria de jogos, uma vez que a Epic é desenvolvedora e responsável pela manutenção da Unreal Engine, um motor de desenvolvimento de jogos de grande popularidade no mercado.

Em audiência preliminar, o pedido da Epic para que fosse requerida da Apple a redisponibilização de Fortnite na App Store com a de opção de pagamento direto à Epic foi negado, mas a suspensão da conta de desenvolvedor da Epic foi impedida, garantindo o direito da companhia a continuar oferecendo suporte à comunidade de desenvolvimento da Unreal.

A Apple declarou em comunicado que, de maneira descrita pelo juiz como enganosa e clandestina, a Epic habilitou um recurso não revisado por ela, violando intencionalmente diretrizes que se aplicam a todos os desenvolvedores e que protegem os consumidores. Além disso, em dezembro de 2020, anunciou que reduziria a parcela cobrada da venda segundo certos critérios. A taxa de 30% seria reduzida para 15% para desenvolvedores que faturassem até 1 milhão de dólares e preenchessem um formulário específico.

Outras grandes empresas como o Facebook, Spotify e o grupo Digital Content Next, representando veículos de mídia como o New York Times e o Wall Street Journal apoiaram a ação judicial da Epic.

O início do julgamento está marcado para maio de 2021, e não terá júri.